O Papel do Psicopedagogo.
Muito se tem discutido sobre o
papel do psicopedagogo, sintoma de que o espaço da Psicopedagogia ainda não
está definido. Pode-se pensar a Psicopedagogia como o espaço para o qual
convergem diferentes áreas do conhecimento cujo campo de atuação seria
identificado pelo processo ensino/aprendizagem.
Por outro lado, ao se considerar
a questão da aprendizagem como uma característica da espécie humana que tem
garantido sua sobrevivência mesmo em condições adversas, desloca-se da sala de
aula e da relação professor/aluno a reflexão, os estudos e a atuação dos profissionais
que pretendem compreender questões ligadas à aprendizagem. Aprender torna-se
ato de vida humana, não de vida escolar.
A Psicopedagogia, neste contexto,
deve ser entendida como uma área interdisciplinar que pretende compartilhar as
reflexões, pesquisas e atuação dos aspectos relacionados ao processo
ensino/aprendizagem.
O psicopedagogo não será,
entretanto, aquele profissional que acolhe recortes de diferentes teorias e constrói
um novo Frankstein. Não será a Psicologia, mais a Pedagogia numa relação
aditiva que dará origem a uma nova disciplina, a Psicopedagogia.
Neste momento em que se discute a
interdisciplinaridade nos meios acadêmicos do Brasil, há que se fazer uma pausa
para se resgatar a Psicopedagogia como, talvez, a primeira proposta interdisciplinar
que apresenta um corpo concreto, palpável e por isso mesmo passível de críticas
e reformulações.
A Psicopedagogia cresce e se
torna possível ao acolher as diferentes contribuições da Linguística, da Fonoaudiologia,
da Nutrição, da Medicina, da Psicologia, da Pedagogia e de tantas outras áreas
de autuação numa perspectiva multiplicativa, fecundante onde todos contribuem e
aprendem. Este é um exemplo de como a divisão pode ser uma multiplicação.
Depende de como e de onde se olha.
Mas a questão da interdisciplinaridade
acaba esbarrando numa característica humana exclusivista, territorialista, que
prejudica essa possibilidade multiplicativa. O psicopedagogo deve superar esses
aspecto, deve aprender a conviver com a falta; mais ainda, o psicopedagogo deve
reconhecer a função positiva da ignorância na medida em que só a partir do
reconhecimento das limitações, das ausências, da falta de algo pode-se
mobilizar e partir em busca da satisfação.
Alicia Fernandez faz uma bela
analogia entre o mito da Arvore da Sabedoria e a aprendizagem no seu livro: La sexualidad atrapada de
la señorita maestra.7 Aqui se pode fazer uma analogia
entre esse mesmo mito, o papel do psicopedagogo e a Psicopedagogia.
Adão e Eva viviam no paraíso,
plenamente satisfeitos até que Eva come do fruto da Árvore da Sabedoria e dá a
Adão o mesmo fruto. Imediatamente eles se dão conta da diferença sexual, o que
equivale dizer da falta e são expulsos do paraíso. A partir daí precisam
produzir para sobreviver.
É só à partir da tomada de
consciência da falta, que se cria, se constrói se produz. Feliz daquele que
pode conviver com suas limitações pois este sim poderá ultrapassá-las através
da criação.
A Psicopedagogia assume suas
limitações e à partir da busca das respostas às indagações que se faz, não teme
transitar por outras áreas, estabelecer parcerias, crescer, se multiplicar como
Adão e Eva expulsos do paraíso.
Muitas vezes caberá ao
psicopedagogo apontar a falta e a possibilidade de convivência saudável com
essa percepção aos seus pacientes, e ele só poderá dar conta dessa tarefa se
puder fazer isso consigo mesmo. O
psicopedagogo não será, portanto, nem o psicólogo, nem o professor particular,
mas será o que falta a cada um deles através de um processo de criação.
(Márcia Siqueira de Andrade
Psicopedagogia Clinica Manual de Aplicação Prática para Diagnóstico de
Distúrbios do Aprendizado. 1ª edição 1998)
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